13.12.09

Nippon Koma 09: dia 6

A sessão da tarde, uma selecção de filmes de Yuki Kawamura, foi a mais experimental de todas. Não posso chamar aos filmes dela animação, mas também não são ficção ou documentário ou outro rótulo comum qualquer. Através de música electrónica e imagens em vídeo trabalhadas digitalmente na pós-produção e não só, temos filmes dignos de uma instalação de vídeo numa qualquer exposição de arte moderna. Mesmo assim os vídeos são extremamente lúdicos e interessantes, tendo sido esta uma das melhores sessões do Nippon Koma deste ano. Não encontrei site oficial (experimentem googlar "Yuki Kawamura" e percebem porquê) mas encontrei este vídeo, que não tendo sido mostrado no Nippon Koma, é claramente dela e também bem interessante.



Sky Crawlers... a vedeta deste ano. Já várias vezes manifestei aqui que acho o trabalho de mamoru Oshii pretensioso, mas este Sky Crawlers foi o filme dele, até agora, de que mais gostei e o único que posso dizer de que gostei verdadeiramente apesar de, para variar, não achar genial. Como sempre o trabalho artístico do filme, cenários, desenho de personagens, animação, animação 3D e efeitos especiais é impecável e imaculado, dando protagonismo mediático a este filme, mas esse mérito não é totalmente de Mamoru Oshii que nada mais faz do que se rodear das pessoas certas. A história do filme é interessante, felizmente com menos filosofias de algibeira o que faz com que ele não se espalhe tanto, mas o filme é demasiado longo, com um tempo de exposição que se arrasta, só se percebendo o conflito do filme quase a meio. Passei o filme todo a pensar em Last Exile, pois o tema e a sua envolvência é algo semelhante, mas Last Exile é muitíssimo superior, mais emocionante. Da mesma forma as cenas de acção, de batalha aérea são espectaculares (animação 3D), mas dêm-me todos os dias Porco Rosso de Hayao Miyazaki, 100% animado à la pata mas 100 vezes superior a Sky Crawlers. E depois há uma coisa que me enerva um bocado no anime em geral e que neste filme é notório. Quando o 3D é hiperrealista e os cenários extremamente elaborados, sem contornos, choca-me sempre a bidimensionalidade e o aspecto plano da animação das personagens que não conjugam. Talvez seja embirração minha, mas se nos animes antigos isso era um defeito técnico difícil de contornar, nos de agora isso irrita-me um bocado. Por fim houve outra coisa que me fez alguma espécie, o facto de os aviões dos protagonistas (com um design bem interessante) e os aviões dos inimigos serem muito difíceis de distinguir em batalha. Das duas uma, ou foi asneira do designer dos aviões, que quis ser demasiado realista, ou foi propositado como um estratagema narrativo para nos indicar [spoiler alert!] que amigos ou inimigos, os pilotos são todos kildren, todos semelhantes. [fim de spoiler alert]

Este Nippon Koma de 2009 foi muito honestamente o mais fraco de todos. Senti falta do lado divertido e tolo do Japão, das coisas coloridas e engraçadas, das compilações de filmes e videoclips da One Dot Zero, dos documentários acerca de temas mais pop ou mais culturais, mais positivos, de me divertir. O público aparentemente concordou comigo, pois desta vez nem a sessão de Genius Party, nem a sessão de Sky Crawlers estiveram perto de esgotar... as outras, estiveram às moscas (ou quase)! Aliás, para o ano, ainda por cima com o aumento do preço dos bilhetes, vou fazer o que fazia sempre antes: antes de comprar os bilhetes pesquisar sobre os documentários e definitivamente só ver apenas aqueles que me despertam algum interesse, seja pelo tema ou por outra coisa qualquer que me chame a atenção. Estou farta de documentários em vídeo digital, mal filmados, com uma imagem manhosa, sem noção alguma de uma linguagem cinematográfica e sem preocupação nenhuma para além de registar, registar, registar... Felizmente a animação dificilmente desilude. Até para o ano!

Culturgest

12.12.09

Nippon Koma 09: dia 5

A sessão da tarde foi a "sessão histórica", uma selecção de filmes dos primórdios da animação japonesa pela Digital Meme e continuação de uma sessão semelhante do ano passado. Os filmes são sempre muito engraçados. Este ano dei por mim a tentar descobrir neles as sementes da estética do anime mais actual, ou pelo menos o anime dos anos 70 e 80. O character design é quase uma cópia das influências directas da Disney primordial e dos irmãos Fleischer, mas já se encontram pequenos desvios mais personalizados, nomeadamente quando são desenhadas personagens femininas que devem ser bonitas ou, melhor ainda, kawaii. Onde claramente a influência não é ocidental é quando as personagens são mais nipónicas (samurais, pessoas em kimono, etc.) e muito nos cenários, extremamente detalhados e com uma gradação de cinzas mais própria dos quadros orientais que de uma animação ocidental mais simplificada.

O documentário da noite, Mental, era ligeiramente mais bem produzido que os anteriores e aborda mais uma vez um tema social mas que pessoalmente me interessa um pouco mais, uma clínica/hospital de pessoas com problemas mentais, desde a esquizofrenia à mais comum doença bipolar. A realidade destas pessoas é triste, principalmente devido a um sistema de saúde longe de ser perfeito e muito por causa do perconceito social. Mas apesar de o documentário ser longo, vemos muita coisa mas vemos muito pouco, pois o filme não acompanha uma única pessoa, mas sim vários doentes da clínica, sem se acompanhar uma caso ou história do princípio ao fim.

Culturgest

10.12.09

Nippon Koma 09: dia 4

O documentário desta tarde foi uma espécie de continuação do conceito de que me queixava ontem... Nestas alturas pergunto-me: o que torna um documentário suficientemente digno de nota para vir parar a uma mostra ao outro lado do mundo? Será por causa do tema social? Será apenas por ser japonês? Será por ter sido produzido há pouco tempo e surgido num qualquer catálogo refundido de uma distribuidora underground? No caso do de hoje, Line, definitivamente a qualidade não era a razão da sua escolha. Qual foi ela? Não faço a mínima ideia... felizmente era curto.

Mas, MAS, para compensar, Mind Game, o filme da noite, produzido pelo Studio 4ºC era excelente! Este filme continua dentro do espírito de tudo o resto que já vi saído deste estúdio de animação: mistura de técnicas, animação com uma estética meio de autor, meio industrial, uma história surreal que parte de um contexto mais ou menos realista, etc. Como estes valores dão pano para mangas e os filmes vão variando bastante, cada vez mais me estou a tornar fã do Studio 4ºC e estou bem longe de me cansar destes filmes... VENHAM MAIS! Não vou descrever nada, Mind Game é divertido, é esquisito, é diferente e recomenda-se.

Culturgest

9.12.09

Nippon Koma 09: dia 3

Comentava eu, pouco tempo antes da sessão da tarde do Nippon Koma, que achava as sessões dedicadas a um só autor problemáticas pois ou o dito autor é muito bom e a sessão é um prazer ou o autor é menos bom e pode se tornar uma seca descomunal...

Felizmente esta sessão, dedicada a Takashi Ishida, pertence à primeira categoria e a sessão foi um prazer surpreendente. Não posso considerar Ishida apenas um autor de filmes de animação, pois ele é mais do que isso. A avaliar pelos filmes exibidos, Ishida é um artista plástico com A grande! Os seus filmes conjugam o trabalho de luz e sombra, através de animações bicolores, nem sempre ou quase nunca sobre papel. Ele utiliza as paredes do estúdio e outros meios tridimensionais de grandes dimensões para desenvolver os seus filmes em stop-motion. As imagens lembram o que seria se Jackson Pollock tivesse animado os seus quadros, mas num trabalho muito além disso que conjuga diversas técnicas, repetições, sobreposições ópticas, trompe l'oeil ou ilusões ópticas, tudo coreografado ao som de música electrónica ou clássica. Numa espécie de culminar de todas essas experiências o filme Film of the Sea, ao substituir o habitual preto por tinta azul, transforma um experimentalismo quase abstracto em algo com que mais facilmente se empatiza, num filme mais consolidado e não apenas o estudo do movimento e da dicotomia luz/sombra apenas guiados pela sensibilidade do autor. Infelizmente calhou na ordem dos filmes ser este o primeiro, apesar de cronologicamente ser um dos últimos do artista (infelizmente já falecido), o que, a meu ver é uma má opção pois há uma clara evolução entre este filme e os outros. Ver primeiro uma obra que representa um culminar de experiências condiciona o visionamento das outras e faz com que dificilmente se goste tanto dos outros filmes. Se por outro lado os filmes tivessem sido mostrados por ordem cronológica teria se apreciado os mesmos em crescendo e talvez percebendo melhor a lógica da evolução da obra no seu todo.

O documentário da noite, A Normal Life, Please, pertencia à categoria dos documentários-câmara-de-vídeo-na-mão-sem-grande-preocupação-com-a-linguagem-cinematográfica, isto é, alguém agarrou numa câmara (segundo a narração um realizador freelancer) e resolveu filmar uma injustiça social sem preocupação alguma com a qualidade, o uso da linguagem cinematográfica ou das suas técnicas. Ah, mas fiquei a saber que, para além de os táxis no Japão terem naperons nos assentos, as cabines dos camionistas têm cortinas de renda preta... OK, é bom ver que o Japão não é o paraíso na Terra, já o tinha manifestado em edições anteriores do Nippon Koma, mas também ando a ficar saturada de tanta reportagem, de os filmes de cariz sócio-antropológico serem apenas, passe a expressão, sobre os podres do Japão, e de não aparecerem outro tipo de documentários que mostrem a sociedade japonesa como uma sociedade normal, com tantas coisas boas como más. Sinto falta dos documentários divertidos de Tsuchiya Yutaka, ou de trabalhos mais antigos mas mais cuidados como o saudoso documentário acerca das Takarazuka ou outros trabalhos na área do documentário e/ou experimentalismo que me digam mais que um qualquer tema polémico.

Culturgest

8.12.09

Nippon Koma 09: dia 2

Porque é que eu nunca tinha ouvido falar da Kusama Yayoi??? Porquê??!!!! Kusama Yayoi é uma artista plástica japonesa que reflecte practicamente tudo o que gosto na cultura japonesa na sua arte e modo de vida: a cor, o pop, a ingenuidade misturada com atevimento, o vanguardismo, uma dose de arrogância e narcisismo, o arrojo, o divertido, etc. O documentário de hoje à tarde era sobre esta senhora, na altura em que fez 77 anos mas que embora tenha alguma dificuldade em se locomover não os aparenta e mantém um espírito extremamente jovial. Pena que, para variar, o documentário não faz mais do que isso, mostrar a almas ignorantes como eu que existe uma artista pop de vanguarda japonesa, com méritos reconhecidos. O documentário apenas informa, ainda por cima centrando-se especificamente na obra que a artista estava a fazer quando o documentário foi feito e mostrando apenas um pouco da sua carreira artística riquíssima que inclui, entre outros eventos, uma passagem por Nova Iorque nos anos 60! Como nunca ouvi falar desta senhora??? [Misato auto-flagela-se]

A sessão da noite foi mais uma sessão de curtas de autor que inclui vários títulos curtos, de menos de 10 minutos, de vários autores. Entre eles está Hiroco Ichinose, que conheci este ano na sessão Beyond Kawaii na Universidade Nova de Lisboa. Pela terceira vez vi Ushi Nichi, o divertido filme da vaca com pijama de vaca! Passou uma segunda curta dela, Ha-P, também engraçada, mas que se destacava menos da amálgama dos outros filmes. Aliás, não sendo nenhum dos outros filmes mau, longe disso, também nenhum era brilhante mas todos nos demonstram mais uma vez que a animação de autor no Japão está a desabrochar com toda a sua força.

Culturgest

Nippon Koma 09: dia 1

Tenho de começar a maratona de Nippon Koma com um desabafo: este ano a Culturgest (suponho que foi a Culturgest), pela primeira vez desde que o Nippon Koma começou, aumentou o preço dos bilhetes de €2 para €3,5. É certo que €3,5 por um bilhete de cinema não é muito, sim, é consideravelmente mais barato que um bilhete normal de cinema que, em geral, já está acima dos €5, mas para quem, como eu, compra bilhetes para todas as sessões convenhamos que €24 não são €42! Às tantas a Culturgest, a organização do Nippon Koma, enfim, quem tem poder de decisão nestas coisas, bem que podia arranjar um "passe" para quem comprasse bilhetes para todas as sessões, ou uma assinatura, como havia no Festival ACARTE, ou algo semelhante, pois a fidelidade deveria ser compensada... Terminou o desabafo!

Este Nippon Koma começou com uma sessão do Genius Party (Beyond), na continuação de Genius Party que fora programado no ano passado. Mais uma vez esta compilação de curtas de animação de autor do Studio 4ºC mostra-nos filmes muito criativos, com um lado surrealista muito forte e uma execução em técnica mista e de primeiríssima qualidade, misturando 3D com animação tradicional e outras técnicas tanto analógicas como digitais. Não vou destacar nenhum filme, embora tenha os meus preferidos, pois considero-os todos equiparados em termos de qualidade e tenho alguma dificuldade em avaliá-los comparativamente.

A sessão da noite ofereceu-nos uma maratona logo no primeiro dia. Uma sessão do documentário Fences, em duas partes, que ao todo chegou a quase 3h. O documentário era mais um documentário "naturalista" onde nos conta a história de uma aldeia próxima de Tóquio que teve de ser "trasladada" para os terrenos ao lado uma vez que os terrenos onde existia foram ocupados pelo exército para armazenamento de munição aérea. Acabada a Guerra a base passou para as mãos dos norte-americanos e apesar de à partida essa localidade, depois de um certo prazo, voltar por direito para os japoneses. Ao abrigo de uma série de leis mal interpretadas os americanos pervalecem e continuam por lá impedindo os habitantes locais de frequentar os locais onde estão os seus antepassados e onde as suas famílias viveram mais de 300 anos. Mais uma vez trata-se de um documentário que trata de um tema com um certo interesse (acredito que maior para uns que para outros) mas que como filme, ou melhor, obra cinematográfica, deixa muito a desejar e não satisfaz inteiramente.

Nippon Koma

Culturgest
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