29.11.05

Nippon Koma: dia 2

Hoje a sessão da tarde não foi anime, mas vou comentar na mesma os documentários.

Desde a primeira edição do Nippon Koma que acho que a grande maioria dos documentários que passam têm como característica a crueza e despojamento de serem feitos por quase amadores com banais câmeras de vídeo 8 ou digitais, estes dois documentários não fugiram à regra.

No primeiro, Now, Where, To? (Tsugi-doko-iku?), o realizador partiu de uma visita a um complexo de apartamentos sociais abandonado para interrogar os próprios pais, a viver num complexo semelhante, acerca do que pensam da própria vida, da sua vivência no apartamento e do que esperam para o futuro. Como bons japoneses as respostas são lacónicas. Ambos sentem que já contribuiram para a sociedade, com filhos e trabalho, conformaram-se, não ambicionam nada em particular.

O segundo filme, Grainy Days (não consegui fixar o título original - que não vem mencionado no programa) mostra-nos o dia-a-dia monótono de uma rapariga que trabalha numa fábrica de Nattou, a sua curiosidade por aviões dada a proximidade ao aeroporto de Narita, o seu reencontro com uma ex-colega de escola, agora prostituta e a concretização da curiosidade, voando num avião.

À noite tivemos a exibição de um clássico: Memories. Não sou grande fã de Katsuhiro Otomo, mas como ainda não tinha visto este filme (ou conjunto de três filmes) fui vê-lo.
O primeiro filmezinho, Magnetic Rose de Koji Morimoto, mostra-nos uma equipe de limpeza de detritos espaciais que é transportada para um universo surreal guiada ao som de Madama Butterfly para salões barrocos de mármore e talha, palcos de ópera, jardins idílicos até às memórias electrónicas de uma suposta diva da ópera vestida à séc.XVIII. Tudo é uma espécie de armadilha para atrair naves espaciais distraídas e engoli-las como se de uma rosa carnívora a engolir um insecto se tratasse.
O segundo filme (e o mais divertido, sem dúvida), Stink Bomb de Tensai Okamura, é uma sátira ao exército japonês com um dedinho do exército americano e a experiências de guerra química ultra-secretas. Toda esta organização metódica e muito séria é posta em causa e mesmo frustrada por um simples funcionário gripado e com excesso de zelo, numa progressão cómica muito bem engendrada.
O terceiro e último filmezinho, Cannon Fodder do famosérrimo Katsuhiro Otomo, mostra-nos um dia na vida de uma sociedade em constante guerra sem propósito e os pequenos sonhos idealizados de um miúdo comum. Este filme tem uma estética bem invulgar para um anime e é muito interessante, mas a mim não me cativou em particular.

Os três filmes são fruto de uma produção muito cuidada que deixa muito além as vulgares produções para televisão. As histórias são originais, com estruturas fora da norma e com um trabalho técnico coerente e muito bem conseguido. De certa forma podem ser considerados filmes de autor comerciais, se é que tal coisa existe (?).

http://www.imdb.com/title/tt0113799/

NOTA: infelizmente outra informação acerca dos primeiros filmes não foi fácil de achar na net, não faço a mínima ideia onde foram desencantá-los

Nippon Koma: dia 1

Nippon Koma é um ciclo de cinema japonês, centrado sobretudo em animação de autor ou alternativa e em documentários, que vai já na 3ª edição, na Culturgest em Lisboa. Desde a primeira edição que deu para perceber que o grande mérito deste ciclo é se poder ver coisas a que difícilmente se teria acesso de outra forma.

O programa das duas sessões de hoje foi a projecção integral da série de anime Paranoia Agent do muito conhecido Satoshi Kon. O bom de ver uma série inteira de seguida é ter-se uma visão do conjunto e a resolução sem a ansiedade de esperar uma semana por cada episódio. A série é curtinha, tem 7 episódios e foi produzida para passar no canal de cabo Wowowow, que tem feito uma aposta séria em anime.

A história desenvolve-se de uma forma bastante surrealista e é contada sob dois pontos de vista: primeiro o das vítimas do 'Shounen Bat' e depois pelo ponto de vista dos investigadores e da investigação. O interessante é que as personagens, mais ou menos desequilibradas, são todas muito ricas e muito realistas, apesar de a história nem sempre ser realista no modo como é contada. Através delas vemos diversos estratos, nem sempre agradáveis e políticamente correctos, da sociedade japonesa, como por exemplo a velhota sem-abrigo que vive (como todos os sem-abrigo no Japão) numa tenda de linóleo azul num jardim público, ou o pai que fotografa a filha adolescente na sua privacidade e vai a prostitutas pedir-lhes que lhe chamem de "paizinho".

Esta foi talvez a sessão comercial do ciclo, se bem que, amanhã também vai dar o muitíssimo famoso Memories de Katsuhiro Otomo, famoso pelo Akira.

Pena foi a primeira sessão (das 18h30), onde passaram os primeiros 4 episódios ter sido dobrada em inglês com legendas em inglês e, pior, com a imagem, originalmente a 16:9 (letterbox), a 3:4 (écran de televisão), portanto distorcida. Como dei por isso fui chamar a atenção ao projeccionista e, felizmente, na sessão seguinte os erros foram ambos corrigidos. Num ciclo com a qualidade que costuma ter o Nippon Koma, não se pode admitir que o anime seja menosprezado como num qualquer canal de televisão, sómente porque o japonês é uma língua estranha e incompreensível para a grande maioria.

http://www.culturgest.pt/actual/nippon_koma.html
http://www.paranoiaagent.com/

17.11.05

Re: Cutie Honey

Finalmente vi os 3 OAVs de Re: Cutie Honey que são divertidíssimos!!!

Re: Cutie Honey pertence a um projecto da Gainax de reedição da velhinha e muito adaptada manga, dos anos 70, de Go Nagai, Cutie Honey que também incluiu um também muito divertido filme live action. A última adapatação que tinha sido feita, Cutey Honey F, era engraçada mas estava mais para Sailormoon que para o original de Go Nagai. Apesar de eu só ter visto os anime adaptados da manga (não vi tudo, tudo) e nunca ter lido a manga, como há mais que uma adaptação acho que dá para perceber que esta versão se volta a aproximar do espírito ecchi (pervertido-atrevido) mas cheio de humor de Go Nagai.

Os OAVs seguem mais ou menos a mesma história do filme live action e, ao mesmo tempo complementam-se. São ambos tão divertidos que é quase impossível vê-los com olhos maliciosos. Ambos, mas o anime em particular, partilham do mesmo humor perverso em que as mulheres difícilmente ficam muito tempo vestidas. Eu costumo dizer que a permissa do filme Barbarella é despir a Jane Fonda e, por mais que mostrem que o tema é a amizade, em Re: Cutie Honey, acho que a permissa é a mesma.

Mas a importância dos sexos e o modo como são trabalhados é mesmo engraçada:
As mulheres são todas poderosas e não vacilam nas suas decisões. Em contrapartida a grande maioria dos homens são uns bananas, onde os mais engraçados são os polícias-figurantes, sempre em forma caricaturada, que riem e guincham com vozes de mulher, que não fazem mais nada senão fugir do perigo e encher o cenário. A excepção é Seiji, que nos serve mais de narrador ou explicador dos porquês das nanomáquinas e como elas funcionam em Honey e nos Panther Claw e o, já morto, professoar Kisaragi, criador de Cutie Honey.

As mulheres, como já disse, são poderosas, rés-vés dominatrix, cujo exemplo máximo é Cobalt Claw, uma das generais da arqui-inimiga dos humanos e de Honey, Sister Jill, vestida com um fato bondage de vinyl azul cobalto. E todas as mulheres mais novas são despidas mais cedo ou mais tarde na história, incluindo as colegas de escritório de Honey.

Ainda temos a carne para canhão dos Panther Claw que são os (homens) androides vestidos de preto com uma rosa vermelha ao peito, que não fazem mais nada a não ser atirar com metralhadoras.

Por toda a história há piscadelas de olho, bastante típicas da Gainax, como, sempre que Cutie Honey aparece as pessoas menosprezarem o seu poder e chamarem-lhe de "cosplay onna" (a mulher em cosplay). O gag mais engraçado acontece quando, no primeiro OAV, a confusão da luta vai parar bem no meio do COMIKET (Comic Market, uma das maiores feiras de banda-desenhada no Japão, onde vão imensos cosplayers) e Honey consegue fugir.

Outra piscadela de olho aconteceu na promoção do filme e do projecto quando, Hideaki Anno, um dos grandes da Gainax, apareceu vestido de Panther Claw!

http://www.re-cutiehoney.com [JP]
http://www.gainax.co.jp/anime/re_cutie/index.html [JP]
http://www.toei-anim.co.jp/shop/dvd_recutie/ [JP]

10.11.05

Jigoku Shoujo

Atraída pelo visual das publicidades que vi (na net e em revistas), comecei a ver um anime, também muito recente, Jigoku Shoujo (Rapariga do Inferno).

Ainda só vi dois episódios, mas o que vi agradou-me. Há muito que não via um anime de terror intimista, as poucas coisas que vi vagamente próximas a este anime foram Vampire Princess Miyu, na mitologia, um pouco no visual e na estrutura da narrativa e Lain, no ambiente. Este anime é uma mistura de adolescência deprimida/oprimida, mitologia shintoísta e terror gráfico, muito ao estilo de Dario Argento.

As duas primeiras histórias são casos clássicos de adolescentes oprimidas nas escolas secundárias japonesas. A primeira é uma menina simples e bem comportada que é diáriamente chantageada e roubada pela colega bonita e popular e seu grupo de acólitas, até que tenta o suicídio (a propósito: já não é a primeira vez que reparo que, quando um japonês se suicida, atirando-se de um prédio, descalça os sapatos, deve ser para poder pisar os tatami do além). A segunda é uma rapariga constantemente assediada por um psicopata que vem a ser o inspector da polícia encarregue de resolver o seu caso, que se prolonga há um ano. Para vingar estes casos de desespero há um site na net onde elas (ou eles) podem pedir vingança em seu lugar. Ao aceitar, recebem um SMS da Jigoku Shoujo a dizer que o assunto está a ser tratado.

Cada episódio é um caso independente que despoleta o mecanismo da vingança e nos mostra as personagens principais do anime. Enma Ai é a Jigoku Shoujo (Rapariga do Inferno), com um ar de colegial japonesa mórbida. Depois há Ichimoku Ren, um rapaz com um ar normal, Hone Onna uma mulher de ar sedutor que se veste de kimono mas como uma prostituta e Wanyuu Dou que é um senhor mais velho que se veste de kimono com um fedora na cabeça e é a voz que ouvimos quando a vingança é posta em curso. Estes quatro são os agentes que explicam e encaminham os "clientes". Ao aceitar serem vingados, o seu alvo é enviado directamente para o inferno, mas há contrapartidas, a alma dos vingados não poderá ir para o céu, quando morrerem, estará condenada a vaguear eternamente e ficam com uma marca ou selo no esterno, como comprovativo do acordo que fizeram.

Enfim, trata-se simplesmente do tema da venda da alma ao diabo, mas passado para um universo shitoísta. É nestas alturas que tenho mesmo pena de não perceber nada de shintoísmo, de apenas reconhecer alguma da sua simbologia. Se dá excelentes histórias de terror, só pode ser uma mitologia interessante.

Quanto ao anime em si, gosto bastante do character design, principalmente o das personagens principais, mas por vezes as feições dos mortais parece que se distorcem, talvez seja propositado, pois o efeito é, sem dúvida inquietante, mas é também muito esquisito. A animação é bastante boa, mas sem nada de surpreendente excepto o efeito no kimono de Enma Ai, efeito esse que tem sido bastante utilizado desde o seu aparecimento, mas que aqui é eficaz sem exageros. Os cenários são bastante bons, muito realistas mas também sem nada de novo. Condizem com a história e a sua situação. Não gosto particularmente das músicas dos genéricos, mas também não me chateiam. A banda-sonora dos episódios já é mais elaborada, com alguns sons que fazem a ligação ao universo shintoísta, como os guizos e que arrepiam.

O ambiente é bastante sinistro e algo angustiante, só não chega a assustar verdadeiramente porque, em 25-30 minutos, não há tempo!

http://www.jigokushoujo.com [JP]

7.11.05

Ando a ver: Para Kiss

Desde que estreou no Japão (e começou a estar disponível na net) tenho acompanhado Paradise Kiss. Como não li a manga não posso comparar, mas desde já deu para perceber que a história é tão emocionalmente envolvente como as outras que conheço da mesma autora.

Já me tinha manifestado quanto ao character design, de que não gostei muito, continuo a não gostar. Descobri recentemente que é de um character designer de que não gosto particularmente, Nobuteru Yuuki, que ficou famoso com Escaflowne e Record of Lodoss War (onde, excepcionalmente, gosto bastante do trabalho dele). Ele é bom, mas há algo no traço dele que me desagrada e que, convenhamos, não tem absolutamente nada a ver com os traços do original de Ai Yazawa.

A história é bem mais adulta e atrevida que o shoujo anime comum, é nítidamente uma aposta num público bem mais crescidinho, nada ver com os públicos-alvo de 12-14 anos de Sailormoon ou mais novos ainda se pensarmos em Doremi ou Nadja. Aliás este anime foi programado pela Fuji-TV como uma aposta num público diferente, mais adulto e com novo horário (à noite) no bloco NOITAMINA (experimentem ler ao contrário). E, estou COMPLETAMENTE apaixonada pela escolha das músicas da banda-sonora, acho que sai lá para o fim do mês, mal posso esperar!

O tema tem a ver com tomar conta ou não da própria vida e da escolha que Yukari/Caroline terá de fazer entre uma vida programada e aborrecida de estudo e boas notas, porque os pais querem e a nova vida que se lhe propõe através de um um grupo muito pouco convencional de novos amigos, com hábitos sociais muito pouco convencionais, principalmente para o Japão. Ainda só vi 3 episódios, parece que a série não vai ser longa (12 episódios apenas), mas já houve decisões tomadas, cenas de marmelanço e Yukari já beijou George de livre vontade. Não foi um beijo roubado após 10 ou 12 episódios, como costuma ser habitual. Até agora a história está condensada o suficiente para haver bastantes mudanças de guarda-roupa (dado o anime que é TEM DE SER), para haver decisões importantes e a história avançar sempre a cada episódio. Já deu para perceber, com tão poucos episódios, certo tipo de acontecimentos ou situações que podem vir a surgir.

A série promete bastante e promete, principalmente, não fazer render demasiado o peixe que é uma coisa que me irrita um bocado quando as séries de anime se prolongam por mais de uma season que tem, habitualmente, 26 episódios (cerca de 6 meses de emissão a um por semana).

http://parakiss.tv [JP]

Ando a ver: Beru Bara

Desde que Nadja já acabou (e reiniciou) no Panda e que Last Exile acabou que não tenho prestado grande atenção aos anime que têm passado nas TVs, excepto Astro Boy. Em parte isso acontece porque tenho visto também os originais, sem censura.

Há já cerca de um mês fiquei chocadíssima por ter visto um episódio de Beru Bara (Berusaiu no Bara = A Rosa de Versailles) no Panda e ter me apercebido que estava grosseiramente censurado e pior, muito provávelmente pelos mesmos franceses que forneceram a série ao canal e lhe mudaram a música do genérico por uma canção que não tem nada a ver.

Como já andava a tirar episódios da série da net (só tinha ainda visto os primeiros 4) ultimamente tenho andado a ver a série e a gostar bastante.

A realização, apesar de ligeiramente datada é muito boa usando muito, em situações de tensão, o recurso a tons contrastantes ou ao vermelho, quase monocromático e a elementos muito gráficos. Com o cada vez maior recurso aos computadores para fazer quase tudo nas séries actuais, certos códigos cinematográficos andam a perder-se e com eles talvez alguma eficácia no uso da linguagem.

O character design e a animação talvez sejam os factores que mais envelheceram. O character design agrada-me muito, sou fã de Shingo Araki, mas é realmente muito exemplificativo do típico character design de shoujos dos anos 70. A animação peca um pouco por ser um bocado estática e abusar um pouco dos ciclos (ou repetições), mas mesmo assim a realização é suficientemente boa para utilizar essas limitações em sua vantagem. A paleta de cores é também um pouco limitada, parece que comprámos uma caixa de lápis de cor Caran D'Ache e que não temos escolha para além das 40 cores disponíveis. Mas, em contrapartida os cenários são muito bons, provávelmente tirados de fotos do Palácio de Versailles e de outros locais que se vão vendo na série.

A banda-sonora, apesar de encaixar lindamente no clima de intriga de corte, é bastante datada (parece que o compositor dos anime naquela altura era sempre o mesmo) e não tem absolutamente inspiração nenhuma em música do séc. XVIII. Como é coerente com a concepção visual acaba por se diluir bem e a música do genérico, se bem que muito baseada em Enka (Enka é um estilo de música popular japonesa, dizem semelhante ao fado - eu não acho -, muito utilizada em cinema e anime nos anos 60 e 70) é dramática o suficiente.

Fora o guarda-roupa, onde, principalmente nas personagens principais, se tomam algumas liberdades históricas (os vestidos de Maria Antonieta foram estilizados para uma moda-anime anos 70 e os fatos militares de Oscar são inspirados em fatos posteriores do fim do séc. XVIII), há poucas incorrecções históricas fora a Ópera de Paris, que ainda não tinha sido construída. Eventualmente, lá mais para a frente, encontrarei outras incorrecções, mas não conheço assim tão bem esse período da história de França e, apesar disso, há uma grande preocupação com a correcção dos factos históricos e mesmo explicação de certos hábitos sociais estranhos a um público nipónico ignorante, em imensos aspectos, da história da Europa.

http://www.ladyoscar.com/
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