Foi preciso existir Beru Bara para me fazer ver um terceiro filme de Jacques Demy... mas felizmente este não é tão sofrível como os Parapluies ou as Demoiselles...
Depois de ver a nova adaptação de Beru Bara, pensei que estava na altura de voltar a procurar o filme franco-nipónico de 1979, realizado por Jacques Demy, mais conhecido por ser um dos membros da Nouvelle Vague, o novo cinema francês do final dos anos 60, cujos autores foram, antes de tudo, cinéfilos e críticos de cinema. E encontrei-o no YouTube.
Apesar do design de produção, sobretudo os figurinos e maquilhagem/cabelos, completamente pirosos, estava à espera de bem pior, pois as imagens não prometem grande coisa e detesto, detesto com toda a minha alma, os dois filmes de Jacques Demy que vi anteriormente, de tal forma que o bani da minha cinefilia.
Só costumo falar de live-actions japoneses, adaptados de material japonês, aqui no blogue, mas Lady Oscar é suficientemente interessante para o fazer (não nunca farei um post sobre o Dragon Ball Evolution ou o filme de Saint Seiya, que também vi recentemente). Lady Oscar é uma adaptação quase contemporânea da manga e anterior à série anime, Versailles no Bara. O que a torna única é que, desta vez, é uma co-produção França-Japão, com actores europeus, falado em inglês, e conta com uma equipa mista de franceses e japoneses, incluindo a notória Agnés Varda! Segundo leio pelas internetes, a Shiseido, importante marca de maquilhagem japonesa, foi o maior patrocinador do filme, e nota-se pela maquilhagem super seventies das moças. E também, que a manga foi traduzida por Frederic L. Schodt, que eu não imaginava andar enfiado nestas cenas dos animes tão cedo, mas faz todo o sentido.
Como os cenários são naturais e um dos principais o Palácio de Versalhes, estes escapam, com a ajuda de uma direcção de fotografia bonita e competente. O guarda roupa é um desastre, principalmente nas mulheres, vestidas de cetim brilhante e com feitios anacrónicos. A banda-sonora é perfeitamente adequada, contendo muitas melodias barrocas em cravo, violinos e afins, que encaixam bem na narrativa e período histórico.
Tal como a adaptação anime de 2025, o filme concentra a narrativa em Oscar, tornando Antoinette uma personagem secundária e Fersen só está lá para compor o ramalhete. Saltam praticamente todo o início e fim da manga, aliás, o filme termina na tomada da Bastilha, mas no geral consegue ser mais coerente com a manga, tendo um argumento mais equilibrado e os acontecimentos-chave mais bem distribuídos (sem números musicais idiotas). Temos a Rosalie e o Bernard, temos a Jeanne Valois de la Motte e o Caso do Colar, temos Robespierre e até temos a Polignac. Não temos Luís XV e DuBarry, não temos Maria Teresa da Áustria nem menção da família austríaca e faltam a intriga política e alguns momentos impressionantes, que levam Oscar a mudar de ideias. A história corre acelerada, pois, como disse no post do filme de 2025, é muito complicado compactar cerca de 20 anos de história, três protagonistas e factos históricos em duas horas. Mas os momentos-chave estão todos lá e a narrativa flui de modo uniforme, não parecendo uma sucessão de quadros. Os actores são competentes, mas com maneirismos difíceis de ignorar na actualidade e nenhum tem um desempenho particularmente marcante. Curiosidade: a Oscar em criança é interpretada por Patsy Kensit, futura estrela pop britânica. Mas, como já disse, a narrativa flui, é empolgante o suficiente para que não haja momentos aborrecidos e o filme vê-se bastante bem, mesmo que mais levezinho que o original. A única crítica que realmente tenho a fazer é o final, que para além de apressado e não ser fiel à manga, peca pela falta de intensidade emocional que torna o romance de Oscar e André mais trágico.
Lady Oscar - Versailles no Bara (1979)